sexta-feira, 12 de março de 2021

Mensagem pelos 15 anos: Paulo Cesar Sandler


"Ter a oportunidade de envelhecer implica em outras oportunidades – como em tudo na vida, surpreendentes, tanto na sua natureza agradável como desagradável. Uma situação nada agradável – pelo menos para mim, que decidi ter uma atividade em si nada agradável, mas absolutamente necessária: medicina – é testemunharmos o desaparecimento de pessoas. Queridas, não tão queridas, pessoas que pudemos conhecer longa e intimamente, que chamamos “amigos”, e outras pessoas que não o são por uma série de fatores que a especialidade que escolhi ajuda a perceber. E em alguns casos a lidar e até – imaginem só – ajudar!

Uma outra atividade que, sem ela, talvez seria o decreto de inexistência da medicina, a dos livreiros, tem me acompanhado desde então. Fui aprendendo – em casa, imaginem só – de que livreiros eram muito bons amigos. Meu pai, a quem segui nessa atividade, pois apaixonado ele era, tinha excelentes livreiros, que lhe traziam livros até mesmo do exterior, lá nos anos cinquenta do século passado. E também um livreiro no exterior, chamado Harry Karnac que ficava enviando livros publicados à prestação e então eram enviados à prestação, como se diziam por aqui. O tempo foi passando, alguns livros passaram a ser publicados aqui e aí conheci mais uma livreira, que era exclusiva daquilo que foi a maior editora de livros de psicanálise (imago editora), por décadas a fio. Sempre apoiada nessa livreira e sem a livreira a editora não subsistiria. Muita gente de hoje em dia a conheceu, chamava-se Dona Maura, e tornamo-nos amigos até seu desaparecimento, como ajudas mútuas que ela nunca esqueceu, e eu até agora não esqueci.

Todos esses livreiros – e só estou contando o nome de dois – que serviram duas gerações de minha família – tiveram uma característica: eram, para nós, únicos. Como os pais, que também nos dão livros e nos educam e nos alimentam; cheguei à conclusão de que há muito mais em comum entre livreiros e mães e pais, do que nossa vã literatura desconfia. Pais, como livreiros, e livreiros, como pais, são fiéis e amigos e sempre nos deixam com boas lembranças.

Há mais ou menos uma década, depois destas surpresas onde o agradável se sucedeu ao desagradável do desaparecimento, fui surpreendido, assim como alguém que nem queria nada, com o aparecimento de mais um livreiro que me lembrou todos que tinha conhecido há mais de 60 anos atrás. E, mais jovens e capazes como sempre são os mais jovens, conseguindo livros que nenhum de todos os outros do passado conseguiam – livros raros, fora de publicação no Brasil. E, como manda a modernidade, onde a cidade de São Paulo não é mais o único centro irradiador, moram em outra cidade, Ribeirão Preto.

Foi assim que conheci meus livreiros únicos desde então, Ana – uma colega de atividade, além do mais!! - e Paulo, seu irmão. Que me pediram, depois de vários pedidos que fiz para eles, uma ou outra coisa, entre elas, que eu escrevesse algo a respeito deles.

Longa vida aos dois e ao seu espaço que chamaram de Psi; já devo muito a eles assim como todos os que conseguem obter seus serviços, os mais exemplares (desculpem pelo trocadilho nada intencional) que já pude ter!"

Paulo Cesar Sandler

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